sexta-feira, 1 de julho de 2011

Coleira

A cadela Coleira está prenhe. A pança, enorme. “Acho que a Coleira vai dar cria... De hoje não passa.” – sentenciou João Antônio pra mulher na hora do café. E continuou: “A lua tá pra mudar e ela anda meio estranha, se escondendo, se entocando por aí...” Maria da Graça apenas escutava enquanto punha lenha no fogão. “Quando eu tava tirando leite, ela começou andar de um lado pro outro, que nem uma tonta...”.
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Na hora da ordenha, a cachorra Coleira mostrou-se estonteada. Andava pra lá e pra cá sem se decidir onde ficar. Percorria o quintal detrás da casa. Andava pros lados do galinheiro, voltava ao quintal, descia pros lados do chiqueiro, vinha de volta ao galinheiro, cruzava a cerca em direção ao galpão, transpunha as estrebarias, retrocedia ao quintal, passava pela frente da casa, farejava, cheirava, procurava um lugar, um esconderijo, uma alcova, uma cova, um lugar para se entocar, uma toca.
Pouco antes do almoço, João Antônio percebeu que Coleira sumira. “Onde será que se meteu essa cachorra desgramada? Agora vai ter essa cachorrada sabe-se lá aonde...”.
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Passaram-se dias e Coleira só aparecia para mal e mal comer as sobras das refeições dos donos e a polenta sem sal feita para os cães e já se escafedia novamente. Coleira ia secando mais e mais a cada dia. Estava que era só carne e osso a coitada.
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Certo dia, Coleira olhou o dono e deu de latir e abanar o rabo e rodopiar ameaçando sair correndo. “O que será que essa cachorra quer? Deve de ter alguma coisa errada com os guaipecas...” A cadela queria que ele a seguisse. “Vamos...”. Coleira dirigiu-se aos fundos do galpão e penetrou numa fresta que dava acesso à parte debaixo da construção. Ali era o ninho. Ali estava a ninhada.
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João Antônio meteu a cara pela fresta. Ouviu uns ganidos surdos. Quando seus olhos se acostumaram com o escuro da furna, avistou dois olhinhos brilhando como farois. Eram os olhos de Coleira. Os filhotes já se locomoviam, mas não eram capazes de subir o degrau da entrada da toca. “E agora, como é que vamos tirar esses bichos daí de baixo?”.
João Antônio teve que remover alguns tijolos para poder retirar os filhotes do buraco. Estavam muito debilitados, cheios de vermes e empestados de pulgas. Levou-os para um lugar mais arejado. Por sorte, havia vermicida na fazenda. Deu aos guaipequinhas, que, não demorando muito, começaram a expelir os vermes.
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Depois do serviço feito, João Antônio comentou, todo orgulhoso, com Maria da Graça, “Esses bichos só faltam falar, se não fosse pela Coleira, acho que os guaipequinhas estariam todos mortos em pouco tempo”.

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