Aquela
noite de sábado para domingo foi longa e fria. Um vento constante assoviava lá
fora fazendo com que os galhos do velho ipê batessem nas paredes da casa. No
céu, cheio de estrelas, as poucas nuvens passavam ligeiras e a lua boiava
solene e tranquila por sobre elas. João Antônio dormiu um sono salpicado.
Ao seu lado, Maria Valéria, volta e meia, gemia e
ajeitava-se na cama dura de colchão de palha. A preocupação com o estado da
mulher naquele fim de gestação afligia João e roubava-lhe o sono. Levantou-se e
permaneceu de pé por alguns segundos balançando-se como se estivesse
embriagado. Estava ainda zonzo do sono mal dormido. Mal conseguiu pregar o
olho. Estava ali agora plantado feito uma árvore em plena ventania. Oscilava de
um lado a outro como um pêndulo de um velho relógio desregulado.
Lá fora, o minuano recrudescia. E era como se balançasse o
homem aqui dentro da casa. O vento parecia também embalar o sono de Maria
Valéria. A mulher, coitada, com seu ventre pronunciado, remexia-se na cama como
que assombrada por um sonho ruim. “E esse vento desgramado que não pára”,
pensou João agora que acordou de vez, “Até parece coisa d’outro mundo. É bem
como diz o padrinho Guinas: noite de vento, noite dos mortos”.
De repente, o vento amainou. O silêncio agora era quase completo
no interior desse rancho perdido por esses confins dos campos de cima da serra.
João Antônio respirou fundo e recobrou a consciência. Dirigiu-se à janela.
Espiou a lua pela fresta da veneziana. “Deve de ser por volta da meia-noite”,
pensou, “a lua já vai alta”.
Lá fora, não havia mais vento. Os galhos do ipê não mais se
moviam. Já não batiam contra as paredes da casa. A mulher voltara a dormir,
tranquila. A geada, que já branquejava o pasto, deixava o campo em derredor parecendo
coberto de prata, brilhante. A lua clareava tudo, até parecia que a aurora
estava por nascer, alva como a luz de uma manhã fria de inverno.
“É, acho que agora já posso voltar a dormir...”