sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Uma pergunta


No forro da casa, o gambá move-se de um lado a outro causando um barulho surdo. “Tenho de dá um jeito nesse desgracido” – pensou João Antônio enquanto reforça o fogo com uns pedaços de lenha seca. Depois, sentou-se no cepo ao canto da cozinha e fecha os olhos. Está visivelmente cansado pela noite mal dormida. Maria da Graça também dormiu um sono agitado. “A coisa é capaz de ser pra hoje...” – refletiu. E enquanto o pensamento o ia levando pelos meandros da memória, pelas vias das lembranças de coisas que aconteceram nos últimos dias, cochilou.
Súbito acordou, meio que assustado. Ficou alguns instantes com um ar palerma. De repente, lembrou-se do feijão e do leite que havia posto sobre a chapa. Por pouco o leite não derramou. Estava já borbulhando nas bordas da velha vasilha amassada pelo uso e pelo tempo. Verteu-o numa caneca. O feijão, comeu ali mesmo na panela, arranhando com a colher o fundo do recipiente. O calor do alimento o deixou reconfortado. “É bom ter algo quente no estômago” – pensou – “eu tava era com fome”. Bebeu em seguida a caneca do leite já morno.
Dentro de pouco tempo, seu corpo cambou para o lado da parede. Fechou os olhos e adormeceu novamente. Pouco depois, acordou com o canto esganiçado do galo anunciando a aurora que não tardará a chegar. João Antônio abriu os olhos e, a princípio, não compreendeu nada. Uma sensação de estranhamento o dominou. Está habituado a acordar sempre no mesmo quarto, com as mesmas paredes, a mesma cama, a mesma mulher a ressonar a seu lado.
Olhou desconfiado para o lado e não viu nada disso. O que viu foi uma caixa de lenha, o fogão. Recobrou a consciência. Lembrou-se que acabou dormitando na cozinha. Esfregou os olhos, bocejou, ajeitou-se no cepo e respirou fundo. O ar renovou-lhe o ânimo e o discernimento das coisas. Permaneceu sentado mais alguns instantes. De chofre veio-lhe à memória a lembrança da mulher. “Será que já nasceu?”, perguntou-se em silêncio.

Nenhum comentário:

Postar um comentário