João
Antônio sentiu um calafrio percorrer-lhe o corpo. Esfregou as mãos uma na outra
para espantar o frio e depois, como se desse um abraço a si próprio, esfregou
os braços. “Tá fria!”, murmurou. Dirigiu-se para a cozinha. Sentia fome. A
ansiedade roubou-lhe o sono causando-lhe o apetite. O interior da casa estava
escuro. Somente um ou outro raio da luz do luar penetrava pelas frinchas das
paredes e das janelas.
Abriu a veneziana da janela da cozinha para que a lua
iluminasse o interior da casa com sua luz diáfana. Procurou, naquele
lusco-fusco, o pedaço de pão de milho que restara do café, mas a mulher já o
havia comido pouco antes de se deitar. Restou-lhe beber um copo de leite que
estava, juntamente com a panela com o resto do feijão ressequido, sobre a chapa
do fogão, frio como aquela madrugada.
Suas mãos tremiam. Não sabia se por causa do frio ou do
nervosismo. Mal tem dinheiro para a comida dele e da mulher e, agora, mais uma
boca para alimentar e um corpo para vestir. Por sorte, sempre há algum animal
para se caçar para matar a fome. João é um bom caçador, mas o coronel Osório
proibiu a caça em suas terras. “Ai daquele que eu pegar caçando em minhas
terras!”, disse um dia o coronel. Vez por outra João embrenha-se no mato a
procura de alguma caça: um tatu, uma perdiz, um veado ou uma lebre.
Acendeu o lampião. Abriu a portinhola do fogão e ajeitou uns
gravetos e um pequeno pedaço de grimpa dentro do fogão. Riscou um fósforo e a
chama do pequeno palito iluminou-lhe a mão e a cara. Assoprou de modo a não
apagar o fogo. Com o sopro, uma nuvem de cinzas subiu, engasgando-o. Tossiu. Permaneceu
calado a ouvir o silêncio e os estalidos do fogo queimando as grimpas para não
incomodar a mulher, que solta, de quando em vez, uns gemidos do aposento
contíguo. Logo, o silêncio reina absoluto.
A flama aqueceu-lhe o rosto e as mãos. Por pouco não
se deixou queimar. Distraiu-se com os ruídos da mulher e do silêncio da noite.
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