sexta-feira, 20 de maio de 2011

Tem lugar pra mais um

João Antônio caminhava pelo chapadão quando o tempo começou a fechar. Negras nuvens surgiram no céu tempestuoso. Faltava ainda um bom pedaço de chão para chegar a casa. Não havia uma alma viva naquele ermo. O frio era intenso e o escuro da noite era um breu só.
Não demorou muito, a chuva começou a cair. Uma chuva constante. Os grossos pingos caiam pesados sobre o caminhante. Perto dali, coisa de meia hora de caminhada, havia um velho cemitério abandonado. João Antônio não queria passar por perto, mas não havia outra solução senão cruzar a várzea aonde o campo-santo fora plantado, pois, se tivesse que dar a volta, a viagem tornar-se-ia muito extensa e ele não queria demorar-se mais.
“É... pelo jeito vou ser obrigado a passar pelo meio desse cemitério. Cre’m Deus Pai” – disse essas palavras benzendo-se todo.
Súbito lembrou-se das histórias e causos que o tio Guinas lhe contava quando criança. Histórias sobre o Gritador, a Mulher de Branco, o boitatá e as almas penadas que voltavam para assombrar as pessoas. Quando deu por si, estava já nas proximidades do cemitério. O coração começou a bater descompassado, quase que lhe saltando pela boca, quando avistou os antigos jazigos de pedra.
“Virge’ Nossa Senhora”, disse e benzeu-se novamente.
Estava no centro do cemitério quando, de repente, uma voz grave e lúgubre de um vulto saindo de entre os túmulos acenou-lhe convidativamente.
“Ô, amigo, pode vir que tem lugar pra mais um aqui!”
A voz veio das profundezas da noite e João Antônio não teve tempo para mais nada senão deitar o cabelo numa carreira angustiante. Não quis saber nem ficou sabendo se a voz era de alguém deste ou se do outro mundo.

Um comentário:

  1. Huahuahuau. Meu vô contava muita história de cemitério. Eu sempre queria ir pra casa logo qiuando começava a anoitecer e meus avós ficavam loimpando os túmulos da família. Bom texto.

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