domingo, 8 de janeiro de 2012

O nascimento


Naquele domingo a filha de João Antônio e Maria da Graça nasceu. Veio ao mundo naturalmente, sem ajuda de parteira nem de auxílio médico, apenas na presença de seu pai e de sua mãe.
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João Antônio foi até a prateleira e pegou uns panos limpos. Súbito lembrou-se da água evaporando no fogão. Verteu então a água fervente da chaleira em uma bacia de metal toda torta pelo uso. Tornou a encher a chaleira e reforçou o fogo com mais pedaços de lenha. Levou a bacia com os panos para o quarto.
Maria da Graça estava de barriga para cima, em posição de parturiente, com as pernas semiabertas e os joelhos levantados. João Antônio fez umas compressas com os panos e colocou-os por sobre o ventre avantajado da mulher. “Se pelo menos a mãe da mulher ou o padrinho Guinas chegasse, bem que poderiam me ajudar com essa encrenca”, refletiu.
Juntou os dois travesseiros de pena de galinha e ajeitou-os debaixo da cabeça da esposa. A agonia da dor fazia com que Maria da Graça forçasse para fora a vida que tinha dentro de si. João tentou ajudar a mulher como pôde, mas Maria, em meio aos gemidos e gritos, disse para que ele se afastasse. O homem, vendo-se inútil, saiu do quarto a fim de procurar a velha tesoura de tosquiar as ovelhas no galpão contíguo à morada.
Encontrou sem dificuldade a tesoura dependurada em uma das paredes do galpão. Estava um pouco enferrujada e suja, pois desde a última tosquia que não a usava. Lavou-a no coxo que fica do lado de fora e levou-a para casa, mergulhando-a, por fim, no fogo por alguns instantes para esterilizá-la.
De repente fez-se silêncio. Logo depois ouviu, vindo do quarto, não os gemidos da mulher, mas o choro estrepitoso de um bebê. Correu e avistou a mulher, banhada em suor e sangue, com uma criança nos braços. Maira da Graça sorriu e chorou ao mesmo tempo ao avistar o seu homem no limiar da porta. Mas não teve forças para dizer uma palavra sequer.
João Antônio, sem se afobar nem desesperar, pois sabia que aquilo era uma coisa natural, fez a volta para buscar a tesoura imersa no fogo. E de volta ao quarto, tratou de cortar o cordão umbilical. Ali, naquele momento, ele soube exatamente tudo. Sua vida agora tinha um propósito. Era pai, e ali estava a sua filha, o seu sangue, a sua vida.
Depois, com a filha em suas mãos e a voz tremida pela emoção, disse para mulher, “É uma menina”. Segurou as palavras para não deixar que as lágrimas escorressem de seus olhos e anunciou: “Maria Antônia! Esse vai ser o nome da bichinha.”

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